Velódromo Paulista
O Velódromo de São Paulo, também conhecido como Velódromo Paulistano, foi um dos primeiros espaços na cidade de São Paulo voltado à exibição pública de esportes.
Textos
A “chegada” e florescimento dos esportes modernos na cidade de São Paulo teve início, ainda no século XIX, com a corrida de cavalos, à época mais conhecida como turfe. Financeiramente sustentada pela oligarquia cafeeira que comandava a cidade, a moda do turfe foi responsável pela criação, no começo dos anos 1880, da primeira praça esportiva paulistana: um hipódromo localizado em um terreno plano da região da Mooca.
Um aspecto fundamental à popularização deste esporte foi o entrelaçamento dos eventos esportivos com as casas de apostas, estendendo o prazer esportivo também às classes mais pobres. Dessa forma, realizava-se uma reviravolta significativa na sociabilidade urbana em que um esporte tornava-se uma das principais formas de mediação entre as abastadas parentelas paulistas e as classes baixas. No mais, foi também pioneiro em instaurar as disputas esportivas como forma de entretenimento urbano espetacularizado, acompanhada rotineiramente por um público leitor por meio do recém-nascido jornalismo especializado.
Foi, então, no bojo da crise cafeeira de 1989 – que desestabilizava as bases financeiras do turfe – e dessas novas formas de sociabilidade urbano-esportiva que surgia a moda do ciclismo na cidade de São Paulo, importado diretamente da França. A seu favor e contrário às corridas de cavalos, o ciclismo tinha ares mais modernos porque se ligava diretamente a um imaginário urbano.
Na esteira da chegada do ciclismo ao país, o empolgado jovem Antonio da Silva Prado Júnior tomava dianteira pela construção de um velódromo na cidade. Herdeiro da parte de sua mãe (Veridiana da Silva Prado) de um terreno de cerca de 25 mil metros quadrados, localizado próximo ao perímetro urbano, na saída cidade (onde se localiza desde 1970 a Praça Roosevelt), Antonio Prado mandou construir na área um espaço destinado às corridas de bicicleta: o Velódromo Paulista. Inaugurado em 1895 e reformado no ano seguinte, contava com estruturas de abrigo ao público com capacidade para cerca de 1000 pessoas – número significativo quando confrontado com a população paulistana à época, estimada em 65 mil pessoas em 1890 e 240 mil pessoas em 1900.
Se em seus primeiros anos, o espaço estava voltado quase que exclusivamente à exibição de atividades atléticas de caráter individual (com destaque ao ciclismo, é claro), a partir de 1900 passou a ser palco de partidas de futebol, contribuindo significativamente à popularização deste esporte na cidade a partir de então.
A tomada de palco pelo futebol, aliás, foi motivada também pelo declínio da moda ciclística no apagar das luzes do século XIX; o que influenciou a apropriação do espaço pelo Club Athletico Paulistano (C.A.P.), entidade esportiva ligada à família Prado e fundamental à organização do futebol paulistano nos primeiros anos do século XX.
Além de mandar seus próprios jogos no Velódromo, a utilização do espaço era feita também por outros clubes em partidas dos campeonatos organizados pela Liga Paulista de Futebol (LPF). Por conta disto, a sede do Paulistano configurava-se num dos espaços esportivos mais importantes da cidade: além de reunir as massas e as abastadas famílias da cidade num mesmo espaço, era palco de exposição de valores sociais envolvidos nas disputas simbólicas sobre os rumos do país por meio dos esportes.
Em 1913, essa mesma liga, a LPF, sofreu uma cisão interna, motivada em boa medida pela hegemonia esportiva nacional e pelas disputas sobre monetarização do futebol paulistano, cujo estopim foi a disputa sobre o local de jogo: os valores de aluguel do Velódromo e do Parque Antarctica eram diferentes, sendo o segundo significativamente mais em conta. No entanto, por conta da liderança do Paulistano sobre a Liga, muitos dos jogos acabavam tendo o Velódromo como espaço, gerando insatisfação entre os demais clubes.
Com o isolamento político inicial da nova liga (a Associação Paulista de Sports Athleticos), liderada justamente pelo C.A. Paulistano, a realização de partidas de futebol em outros e novos espaços ganhava corpo, tornando o ostracismo do Velódromo questão de tempo. E assim foi: o campeonato de 1915 organizado pela APSA foi o último disputado no Velódromo, já sem o mesmo sucesso de outros tempos. Neste mesmo ano, a Companhia Brasileira de Immoveis e Construção moveu ação de despejo contra o economicamente fragilizado C. A. Paulistano e anunciou o loteamento do terreno, demolindo finalmente o Velódromo no início de 1916. Era o fim de um dos espaços de apresentação futebolística mais importantes da cidade de São Paulo nas primeiras décadas do século XX.
STREAPCO, João Paulo. “Cego é aquele que só vê a bola.” O futebol em São Paulo e a formação das principais equipes paulistanas: S. C. Corinthians Paulista, S. E. Palmeiras e São Paulo F. C. (1894-1942)
GAMBETA, Wilson. A bola rolou: o velódromo paulista e os espetáculos de futebol. São Paulo: SESI-Editora, 2015.